As prisões foram
criadas para estabelecer meios de punir toda sorte de crime sem precisar apelar
para a tortura física. Para que não se responda o horror da violência com mais
violência. Em teoria, um chamado à razão e à humanidade. Mas passados séculos
desde que o horror explícito deixou de ser admitido como castigo, a sociedade
ainda mostra, em casos como o da trans de Suzy de Oliveira, uma queda pelo
linchamento em praça pública.
E a “internet é
hoje a grande praça pública onde linchamentos ocorrem”, afirmou o advogado
Thiago Amparo, em artigo na Folha desta segunda (9). “A humanidade de Drauzio
diante de Suzy te incomoda porque guardas em ti a espera do linchamento físico
que não virá e guardas no linchamento digital a última esperança”, escreveu ao
leitor.
Suzy caiu nas
graças de parte do público depois de ser personagem de uma matéria do programa
Fantástico, com o médico Drauzio Varella, que demonstrou humanidade ao dar uma
abraço na transsexual que há mais de 8 anos não recebe visitas. Somente após a comoção toda com asolidão de Suzy, é que o crime dela veio à tona: estuprou e
estrangulou até a morte um menino de 9 anos, em 2010. Está presa desde então,
cumprindo 36 anos de cárcere.
Drauzio e Globo
tiveram que se explicar. A extrema-direita aproveitou para defender pena de
morte para crimes hediondos.
Na visão de Amparo,
o caso fará o senso comum, erroneamente, pensar que “o cárcere – que hoje
abriga mais de 700 mil pessoas – está repleto de pessoas que tenham cometido
atos como esse. Não está.” Ou que “se Drauzio a tivesse rompido a cavalos
como um juiz francês que não é, seria feita a justiça. Não seria.”
Além disso,
“linchamento digital te fará esquecer, meu caro leitor, que a maioria das
mulheres transexuais e travestis presas hoje está presa por crimes patrimoniais
ou de drogas, não crimes sexuais.”
Amparo é professor
de políticas de diversidade na FGV Direito SP, e doutor pela Central European
University (Budapeste).
Fonte: Jornal GGN
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