Na luta contra a ditadura existiram algumas palavras de
ordem. Vou relembrar as três principais: o povo organizado derruba a ditadura,
o povo armado derruba a ditadura, o povo no poder.
O povo organizado significava uma condição, o povo
armado indicava um caminho, o povo no poder o objetivo posterior, antes era necessário
apear os militares do poder, por isso mesmo a palavra de ordem geral e
unificadora era ABAIXO A DITADURA.
Nunca colocamos o ditador de plantão como o alvo
central, o alvo era o sistema ilegítimo, arbitrário, tirânico, antipovo, isto
é: a ditadura militar vigente.
As palavras de ordens podem significar condição,
caminho, objetivo e até posterior desígnio. Cada uma precisa ser colocada no
tempo certo para ser viável ou no tempo todo para ser vetor.
Bolsonaro, é como o seu apelido de infância, palmito,
que mal conservado ocasiona o botulismo. O botulismo, que é uma doença que gera
a paralisia da musculatura, é o alvo a ser atingido, antes que a paralisia das
instituições propicie a consolidação do Estado policial de natureza
nazifascista.
O presidente sociopata, o tempo todo provoca e testa as
instituições, dependendo da reação, recua e volta a testar. Nessa tática comum
de guerra psicológica e de movimento, usa de blefe, meias verdade e mentiras,
ele vai paralisando, sitiando as instituições e avaliando o poder de reação das
forças contrárias e de seu próprio handicap.
Desrespeita a Carta Magna, desafia os demais poderes
republicanos, incita seus áulicos, confunde e divide a população, e contribui
para o caos. Já ultrapassou todos os limites da civilidade e da legalidade. De
forma que se não for apeado do governo, as instituições democráticas ficarão
desmoralizadas e ele hipertrofiado.
O bolsonarismo é maior que o seu palmito e vai ter vida
política mesmo depois que o sociopata miliciano for derrubado. Mas enquanto não
ocorrer, vai se consolidando como movimento antidemocrático e belicoso.
Em tempos de pandemia da Covid-19 e dos pandemônios
produzidos pelo bolsonarismo (governo e seguidores), o povo sofrerá mortes,
desempregos, fome, miséria, em proporções nunca vistas.
O povo responsabilizará a quem, ao inimigo invisível ou
ao inimigo visível?
Nesta altura a situação é de um dilema: ou Bolsonaro
cai ou o bolsonarismo se fortalece com o seu modus operandi e sem freios.
A condição para tirar o Bolsonaro do poder é o
fortalecimento da bandeira Fora Bolsonaro, porém, não é o suficiente, pois o
povo e a esquerda sem as ruas ficam quase invisíveis, vez que no campo
institucional está enfraquecida e Lula também fica com pouca visibilidade, por
boicote da mídia golpista e também porque o seu forte é o contato com as
massas.
A esquerda, mesmo que desejasse, não conseguirá, nessas
condições, o protagonismo do movimento para tirar o sociopata do poder.
E o caminho qual será? Impeachment, interdição,
renúncia, licença? Qualquer que seja dependerá das mesmas forças golpistas de
sempre, das que deram o golpe de 64 e de 2016.
Deriva daí ficarmos olhando a banda passar? Não,
“never”, jamais!
A associação do bolsonarismo com a lavajatismo tem que
ser fomentado na consciência da sociedade. Mostrar que o bolsonarismo é filhote
do lavajatismo.
Como levar Bolsonaro e Moro a responderem pelos mesmos
crimes?
O lavajatismo é a versão moderna do modelo golpista de
sempre, que usa da bandeira da luta contra a corrupção para derrubar governos
progressistas e continuar praticando a corrupção, que é da essência do sistema.
Por isso, os mantenedores do sistema utilizam dessa bandeira, a qual o povo é
suscetível de apoio, no limite de seus interesses políticos e sistematicamente
delinquentes.
Se a sociedade se conscientizar que a associação
Moro&Bolsonaro é uma coisa só, será desafiador para estabelecer a
prioridade na palavra de ordem alvo: Abaixo o bolsonarismo ou lavajatismo.
Explorar as contradições que estarão existindo durante essa refrega entre eles,
será de muita importância para a conscientização do povo. Devemos estar atentos
que ambos são mentirosos, mas dizem verdades quanto se trata de falar um do
outro.
Nesta especial situação de tripla crise que o Brasil
vive, o “Abaixo o bolsonarismo” é imediata, mas não dever ficar sem conexão com
a crítica ao lavajatismo.
Fora Bolsonaro cresce na vontade do povo e a esquerda
não deveria ficar orientado por análises lógicas, tecnicamente brilhantes, mas
não dialéticas, não sob o eixo histórico da luta de classes.
Quando uma vontade social, mesmo que virtual, ganha
força, os partidos de esquerda, principalmente o PT, devem estar junto na
condução. Se não exercem esse papel, a direita encampa e dá o sentido e o
destino que lhe interessa.
O cristianismo foi encampado pelo poder romano e deu no
que deu, as manifestações de 2013 foram encampadas pela Globo e deu no
impeachment da Dilma.
Sem as ruas, sem o parlamento e o STF presenciais, e
sem paridade de armas na luta jurídica e política, o desafio da esquerda é
muito grande e complexo.
Contudo, quando a situação for mais complexa do que a
nossa capacidade analítica, nos guiemos por um princípio leninista: “Não nos
isolemos do povo, submetamo-nos ao seu veredito cada um de nossos passos, cada
uma das nossas decisões, apoiemo-nos por inteiro, e exclusivamente, na livre
iniciativa que emana das próprias massas trabalhadoras.”
Francisco
Celso Calmon é administrador, advogado, coordenador do Fórum
Memória, Verdade e Justiça do ES; autor do livro Combates pela Democracia
(2012) e autor de artigos nos livros A Resistência ao Golpe de 2016 (2016) e
Comentários a uma Sentença Anunciada: O Processo Lula (2017).
Fonte:
Jornal GGN
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