“Eu avisei”. 2 palavras que são proclamadas
principalmente pelo campo progressista e democrático desde que Jair Messias
Bolsonaro começou seu (des)governo em 2019. Bolsonaro, que não perde a chance
de se fazer de Messias, também faz uso de uma célebre frase bíblica para
justificar o obscurantismo e a confusão diante de suas ações – “E conhecereis a
verdade, e a verdade vos libertará.” (João 8:32). Ocorre, que diante dos
primeiros 500 dias em posse da presidência, Bolsonaro tem provado que suas
ações de nada diferem de seu histórico nas últimas décadas. Muito além do “eu
avisei”, à luz dos fatos, nos cabe questionar, “e agora?”
15 de maio de 2020, são 500 dias com ele – ou melhor,
#EleNão -, como presidente da República. Bolsonaro (agora sem partido) já passou por nove partidos em seus 28 anos como
Deputado Federal, oscilando de acordo com seus
interesses familiares. Diante do desastre em posse da Presidência, o
“eu avisei” tem se tornado uma denúncia constante para os milhares de absurdos
e, pior, ataques explícitos de Bolsonaro contra direitos fundamentais do povo
brasileiro. Soma-se ao cenário, a radicalização de sua base mais fiel, com aumento de popularidade e polarização, tendo
desprendimento diário de mais moderados conforme o radicalismo aumenta.
Conforme aliados ocasionais ou pessoas que se dizem
traídas vão se desprendendo do bolsonarismo, o que fica é a contradição de que
Bolsonaro implementa nada mais do que sempre prometeu. Isto é, aos que se
arrependem do voto – e fazem bem, apesar de tarde -, ou não tiveram acesso ao
seu histórico de promessas, ou não levaram a sério as denúncias que chegaram
por todos os lados. Nesse sentido, este artigo reúne diversas falas ao longo do
esvaziado mandato de Bolsonaro como Parlamentar e o resultado dessas falas –
que para muitos soavam vazias -, agora em posse do Estado brasileiro.
Muito além do “eu avisei” é momento de explorar as
contradições e fazer do arrependimento ao bolsonarismo, força motriz para que
as denúncias que virão não sejam, mais uma vez, ignoradas. Até porque,
Bolsonaro faz muito estrago, mas quando Bolsonaro passar – e há de passar -, o
bolsonarismo, seguirá, sem dúvidas, disputando espaço enquanto movimento.
Portanto, transformar o “e daí” da indiferença antipática do bolsonarismo em “e
agora?” da união nacional propositiva e racional do povo, talvez seja um dos
maiores desafios que tenhamos em frente.
Corrupção
no Bolso
Antes da
Presidência
Desde 1999 Bolsonaro já confessava em entrevista, sem o menor receio: “Eu sonego
tudo que for possível”. Mais recente, em 2018, ao explicar a polêmica
dos R$ 200 mil da JBS, admitiu que seu partido recebeu propina:
“qual partido não recebe?” -, para além de manter funcionária fantasma paga com
dinheiro público; e que, como “estava solteiro naquela época, esse dinheiro do auxílio-moradia eu
usava para comer gente”.
Mamata e
nepotismo
Bolsonaro, assim como tantos dos seus apoiadores e
aliados, também bradaram ao longo desses anos que “acabou a mamata”. Os
exemplos dado por esse governo constatam justamente o contrário. Em meados de 2019, Jair já dizia que o filho Eduardo
poderia assumir a liderança do PSL (o que foi feito) ou até a embaixada dos
EUA, ainda que a experiência declarada do “filho 03” era de ter “fritado
hambúrgueres” no país (o que é impreciso, já que o restaurante no qual
trabalhou sequer tem hambúrgueres no cardápio), além de seu inglês ser absolutamente
incompatível com o cargo. Ainda em 2019, veio à público
que entre 2015 e 2016, Bolsonaro empregou cinco funcionárias que nunca foram ao Congresso,
porém com o salário em dia.
Extinção
do Conselho de Combate à Corrupção
Em posse da Presidência, em junho de 2019,
Bolsonaro extinguiu o Conselho da Transparência Pública e Combate à Corrupção
(CTPCC), dentre quase 40 conselhos de fiscalização da administração pública.
Gastos
no cartão coorporativo
Entre janeiro e março de 2020, as despesas do cartão
corporativo da presidência dobraram em relação à média do mesmo período dos
últimos 5 anos, superando inclusive os gastos dos governos Temer e Dilma. Os
gastos podem ser acompanhados pelo Portal da Transparência.
Desprezo
à Democracia
Antes da
Presidência
Em 1999, já Deputado Federal, Bolsonaro afirmava
que certamente daria um golpe no mesmo dia, caso fosse
presidente “[…] Através do voto você não vai mudar nada nesse país, nada,
absolutamente nada! Só vai mudar, infelizmente, quando um dia nós partirmos
para uma guerra civil aqui dentro, e fazendo o trabalho que o regime militar
não fez: matando uns 30 mil, começando com o FHC, não deixar para fora não,
matando! Se vai morrer alguns inocentes, tudo bem, tudo quanto é guerra morre
inocente.”.
Em 2016, voltou a afirmar que “o erro da ditadura foi torturar e não matar”, repetindo a
mesma declaração proferida anos antes, em 2008, durante discussão com manifestantes em frente ao Clube Militar, no
Rio de Janeiro. Ainda, durante
a votação de impeachment da então presidente Dilma Rousseff
(2016), prestou homenagem ao torturador condenado, Coronel Carlos Ustra.
Mais recente (2017), exercitando a intolerância
religiosa, Bolsonaro bradou em carro de som: “Deus acima de tudo. Não
tem essa historinha de Estado laico não. O Estado é cristão e a minoria que for
contra, que se mude […] as minorias têm que se curvar para as maiorias” Em
visita ao exército, ainda em 2017, Bolsonaro disse que sua “especialidade é matar”, mesmo que nunca tenha executado
qualquer missão oficial com tal demanda. Dando continuidade à propagação da
chacina, em campanha em Rio Branco (2018), disse “Vamos
fuzilar a petralhada aqui do Acre”.
Ainda, uma semana antes de assumir a presidência
(2018), Bolsonaro twitta a frase “Grande Dia”, logo após o ex-deputado Jean Wyllys anunciar
que não retornaria ao Brasil para cumprir o seu terceiro mandato, por medo das
ameaças que já vinha recebendo há anos.
Slogan
com inspiração alemã
Em posse do Estado, o slogan escolhido para seu governo
foi “Brasil acima de tudo. Deus acima de todos”, tendo assombrosa semelhança
com a popular frase da Alemanha Nazista “Deutschland über alles”, ou “Alemanha acima de tudo”. A
diferença seria uma pitada a mais de fundamentalismo religioso.
Sem
sociedade civil
Em junho de 2019, Bolsonaro extinguiu quase 40 conselhos estratégicos de participação da sociedade civil,
limitando a participação e acompanhamento de entidades e organizações diversas
na elaboração de políticas públicas já implementadas. Houve ainda a expulsão da sociedade civil do Conselho Nacional de
Políticas sobre Drogas (Conad).
Ataque
ao presidente da OAB
Em julho de 2019 Bolsonaro ataca o presidente
da OAB, Felipe Santa Cruz, provocando-o que, se “quiser saber como é que o pai dele
desapareceu no período militar, conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a
verdade. Conto pra ele”.
Envolvimento
no assassinato de Marielle e Anderson
Entre abril e maio de 2020, diante das interferências de Bolsonaro para troca da Polícia Federal,
documentos passaram a reafirmar a relação da família Bolsonaro com o brutal assassinato da vereadora
Marielle Franco e Anderson Gomes, seu motorista. Vale recordar que o
vizinho de Bolsonaro, acusado de matar Marielle e Anderson, detinha um arsenal em sua casa.
Além do vizinho, existia também ligação
com Adriano da Nóbrega, um ex-policial do Bope – homenageado por Jair e Flávio Bolsonaro. Ele foi
considerado chefe um dos chefes do “Escritório do Crime” – uma milícia de
matadores de aluguel do RJ – e teve um mandato de prisão expedido
em Fevereiro de 2019, consequente de uma operação contra milícia no RJ. Foi encontrado e morto a
tiros durante confronto policial na Bahia, onde estava escondido. Anderson era
considerado uma peça chave tanto no Caso Queiroz quanto da morte de Marielle.
há forte suspeita de queima de arquivo.
A dúvida
permanece: Quem mandou matar Marielle Franco?
Abertamente
contra a democracia
Em meio à pandemia, Bolsonaro participou de diversos
atos e aglomerações entre março e maio de 2020 que continham faixas pelo fechamento do Congresso, do STF e pedindo o AI-5,
com profissionais da imprensa violentamente agredidos. Ainda,
durante o crescimento dos casos da covid-19, Bolsonaro recebeu Curió, símbolo de assassinatos na ditadura
em maio de 2020.
Punição
às críticas
Ainda em maio de 2020, a Escola Superior de Guerra
(ESG) enviou um ofício ao Ministério da Defesa questionando a
possibilidade de punir servidores que critiquem o presidente. No mesmo fim de
semana, a Secretaria Especial de Comunicação Social (Secom) critica, em post no twitter, a cobertura da mídia durante a pandemia,
finalizando a postagem com “O trabalho, a união e a verdade libertarão o
Brasil”. Mais uma dentre as frases usadas pelo governo que remetem ao nazismo,
dessa vez do slogan “Arbeit macht frei” (“O trabalho liberta”, em alemão),
inscrito na entrada dos campos de concentração.
Despreparo
e Ingerência
Antes da
Presidência
Quando Deputado Federal, durante 28 anos aprovou apenas dois projetos de lei. Sem
qualquer compromisso técnico ou programático com a melhoria da qualidade de
vida da população de seu estado, apresentou uma média de seis projetos por ano, ou um a cada dois
meses, ignorando saúde e educação. Como exemplo, Bolsonaro já
quis batizar a faixa marítima do país como “Mar Médici” (2015),
em homenagem ao Ditador e, ainda, exigir todos cidadãos a colocassem a mão direita no peito durante o
Hino Nacional (1998).
Durante sua campanha (2018), sem planejamento estratégico para governar o país, Bolsonaro
apostou na onda (ou melhor, tsunami) anti-petista para ganhar popularidade,
como um punhado de outros deputados, prefeitos e governadores (como esquecer
o clássico slogan de João Dória, o “BolsoDória”, que era contra
“tudo
que é contra a esquerda”). Para deixar evidente sua falta de projeto
para o país, Bolsonaro sequer participou dos debates nas eleições de 2018.
Sem
palavras
Em janeiro de 2019, no Fórum Econômico Mundial de Davos, Bolsonaro usou apenas 6
dos 45 minutos previstos, com fala rasa e trazendo poucos elementos
estratégicos e deixando os investidores internacionais sem clareza de seu
projeto.
Sem
dobrar a meta
Segundo estudo organizado pela Agência Lupa, Bolsonaro concluiu
menos da metade das metas prometidas aos primeiros 100 dias de mandato (abril
de 2019).
Distorção
da Realidade e Narrativa
Antes da
Presidência
Durante a campanha eleitoral (2018) não faltaram
denúncias da rede de propagação de notícias falsas (fake news) organizada pela
campanha de Jair Bolsonaro. Tais denúncias levaram a investigação a identificar
a família Bolsonaro como articuladora do esquema criminoso de fake news.
Golden
shower
Em março de 2019, o chefe de Estado se voltou para
difamar o carnaval, compartilhando vídeo obsceno e perguntando em seu twitter “o que é Golden Shower?”.
Brasil
sem fome?
Mesmo com 13,5 brasileiros em extrema pobreza (2019), em julho de
2019, Bolsonaro afirmou que “falar que se passa fome no
Brasil é uma grande mentira. Passa-se mal, não come bem. Aí eu concordo. Agora
passar fome, não. Você não vê gente pobre pelas ruas com físico esquelético
como a gente vê em alguns outros países por aí pelo mundo.”
Gabinete
do ódio
Em março de 2020, estudo apontou que mais da metade do apoio nas redes de Bolsonaro é forjado por robôs.
Ainda, em abril de 2020, após meses de investigação da CPI das Fake News,
a relatora apontou que “Bolsonaro age em conjunto com o gabinete do ódio”. Ainda,
que “pula de galho em galho” em busca de um novo inimigo para manter a
“adrenalina” de seu “grupo de cachorros loucos”.
Ataque à
imprensa
Após inúmeros ataques à imprensa, buscando desmoralizar
o papel do jornalismo, em março de 2020, Bolsonaro colocou um humorista para conversar com jornalistas sobre
o desaceleramento da economia brasileira. Isso após “dar banana” para jornalistas pela segunda vez em duas
semanas – A primeira vez foi após reclamar da repercussão de sua fala afirmando
que “pessoa com HIV é despesa para todo o Brasil“, antes de ir à
um evento evangélico. Ainda, em maio de 2020, Bolsonaro mandou jornalista calar a boca.
Ranking
de declarações falsas
Ainda, em 500 dias em posse da Presidência, Bolsonaro
acumulou 1023 declarações falsas ou distorcidas, segundo mapeamento organizado pela Aos Fatos.
Machismo
e LGBTFobia
Antes da
Presidência
Parte da fama de Bolsonaro surgiu em 2003, após o
então parlamentar chamar a Deputado Maria do Rosário (PT) de “vagabunda”,
afirmando “não te estupro porque você não merece”. Mesmo em batalha
judicial – e ordenado, em 2019, a pagar R$10 mil por danos morais – Bolsonaro não
hesitou em dizer “por isso o cara paga menos para a mulher [porque ela engravida]”
(2014) reafirmando em entrevista no programa “Superpop”,
em 2016 que “não empregaria [mulheres e homens] com o mesmo salário”.
Em entrevista à revista Playboy em 2011 Bolsonaro
afirmou que prefere um filho morto a um herdeiro gay e diz que ser
vizinho de um casal homossexual é motivo de desvalorização de imóvel. “Seria
incapaz de amar um filho homossexual. Prefiro que um filho meu morra num
acidente do que apareça com um bigodudo por aí.”, pois “ter
filho gay é falta de porrada”. Ainda, em ritmo de campanha (2018),
reclama que casais homossexuais estariam em busca de “privilégios”
e afirma: “Eu tenho imunidade para dizer que sou homofóbico sim, com muito
orgulho […] eu prefiro ter um filho viciado do que um filho homossexual”.
“Se
quiser vir fazer sexo com mulher, fique à vontade”
Já em posse da Presidência, em abril de 2019,
Bolsonaro comentou que
“O Brasil não pode ser um País do mundo gay, de turismo gay. Temos famílias.”.
Mas que “Se quiser vir fazer sexo com mulher, fique à vontade” – reforçando seu
machismo ao validar a exploração de mulheres e o turismo sexual, ainda fazendo
associação entre homosexualidade e imoralidade.
Extinção
Conselho de Combate à Discriminação LGBT+
Dentre outros conselhos de fiscalização e participação da sociedade
civil, em junho de 2019, Bolsonaro extinguiu o Conselho
Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de LGBT
(CNCD/LGBT).
“O
Brasil é uma virgem que todo tarado de fora quer”
Pouco tempo depois (julho de 2019), incapaz de
estabelecer reflexão profunda sobre o meio ambiente, Bolsonaro apostou no
machismo ao
reclamar sobre a demarcação de terras indígenas e preservação
ambiental, afirmando que “o Brasil é uma virgem que todo tarado de fora quer”
e, portanto, melhor entregar às oportunidades.
Financiamento
zero para comunidade LGBT+
Com edital que havia selecionado produções para TV
pública sobre diversidade de gênero e sexualidade, em agosto de
2019 críticas de Bolsonaro levaram à proibição do financiamento para filmes ligados às temáticas LGBTs e,
em janeiro de 2020 Bolsonaro orientou Regina Duarte a não financiar a pauta LGBT na
Cultura, ainda criou uma “curadoria” afirmando “pode fazer, mas não
com dinheiro público”, como se a população LGBT+ não compusesse a sociedade
brasileira.
Racismo
Antes da
Presidência
Em entrevista ao programa CQC, da Band, em 2011,
Bolsonaro afirmou que “não entraria num avião pilotado por um cotista, nem
aceitaria ser operado por um médico cotista”. Ainda na mesma entrevista, é
questionado pela cantora Preta Gil sobre como reagiria se um de seus filhos
namorasse uma negra, respondendo: “não vou discutir promiscuidade com quem quer
que seja. Eu não corro esse risco e meus filhos foram muito bem educados” Em
2017, no Clube Hebraica (2017), disse “Eu fui num quilombo em
Eldorado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava 7 arrobas, não
fazem nada. Eu acho que nem pra procriador serve mais”.
Ainda, em mais de 80 páginas do plano de governo do então candidato
(2018), Bolsonaro, a equipe dele não cita em nenhum momento as palavras “negro”,
“negra”, “indígena”, “etnia” e “raça”, muito menos existem propostas de
políticas de ações afirmativas.
Extermínio
da população negra
Enquanto em maio de 2019, Bolsonaro afirmava
que “racismo é algo raro no Brasil”, em outubro de 2019,
a ONG Educafro denunciou na ONU o aumento das mortes
envolvendo a população negra e o percentual de 75,5% do total dos homicídios no
Brasil durante a gestão de Bolsonaro.
Sem
consciência
Após a destruição de uma placa na Câmara dos Deputados
em alusão à violência contra a população afrodescendente em novembro de
2019, Bolsonaro optou por ignorar tanto a destruição da
placa, quanto o dia da consciência negra – dando continuidade à política de
omissão do Estado implementada abertamente desde o início de seu mandato.
Desprezo
ao Meio Ambiente
Antes da
Presidência
Após discussão com indígena em Audiência na Câmara
(2008), disse que “Ele devia ir comer um capim ali fora para manter as suas origens”.
Fogo na
Amazônia
Em março de 2019, o céu em cidades do Sudeste escureceu durante o dia, isso
porque as chamas na Amazônia já se alastravam há quase duas semanas. Dessa vez,
Bolsonaro decidiu jogar a culpa para o ator Leonardo DiCaprio e a ONG WWF;
Ainda, quando a crise foi denunciada pelo Instituto Nacional de Pesquisas
Espaciais (Inpe), Bolsonaro respondeu com a exoneração de Ricardo Galvão,
presidente do Instituto, além de rejeitar ajuda de US$ 20 milhões do G7 para a
Amazônia, como uma resposta birrenta às críticas feitas pelo presidente da
França, Emmanuel Macron. Bolsonaro disse que só aceitaria o dinheiro se Macron pedisse desculpas, demonstrando novamente que o
seu imenso ego vaidoso está, lamentavelmente, acima do bem estar da população.
Houve recuo dessa condição, horas depois, declarado pelo porta-voz
do governo. Vale lembrar que, nesse meio tempo, Bolsonaro endossou uma montagem sexista feita por um de seus
seguidores, zombando da aparência de Brigitte Macron, primeira dama da
França.
Meio
ambiente só para veganos
Em julho de 2019, Bolsonaro já afirmou que “[A questão ambiental importa] só aos
veganos que comem só vegetais.”.
Vazamento
de óleo no Nordeste
Em outubro de 2019, o Governo Bolsonaro demorou mais de um mês para iniciar investigação do
vazamento de óleo no Nordeste, colocando a culpa na Greenpeace, insinuando que a ONG
só atrapalha e de que o vazamento teria sido um “ato terrorista”. Enquanto
isso, centenas de pessoas se mobilizaram, colocando a saúde
em risco, para limpar voluntariamente as praias.
Grilagem
liberada
Mais recente, em dezembro de 2019, apresentou a
Medida Provisória 910/2019, prevendo anistia ao crime de invasões de terras
públicas entre 2011 e 2018 e beneficiando principalmente a prática de grilagem
e os grandes produtores, precarizando ainda mais as condições da população
indígena e tradicional, além dos produtores familiares. A tragédia denunciada
por diversas organizações, conta com estudo do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN),
detalhando didaticamente suas implicações.
Uso Político da Pandemia
“É só um resfriadinho”
Em março de 2020, enquanto Bolsonaro chamava a
pandemia de “fantasia propagada pela mídia”, pesquisadores da UFMG apontavam o aumento no nível de populismo do presidente com
sua convocação de manifestações. Ainda, estudo realizado por economistas da Faculdade Getúlio
Vargas e da Universidade de Cambridge aponta relação direta de causa e efeito
entre as declarações do presidente contrariando recomendações da Organização
Mundial da Saúde (OMS) e o não cumprimento do isolamento social pela
população. Entre março e maio de 2020, da “gripezinha” ao “e daí?”, as
frases de Bolsonaro foram se acumulando enquanto o vírus se alastrava pelo
país, com diversos levantamentos denunciando a ingerência diante da crise.
Sem ONG,
tá ok?
A própria Fundação Nacional do Índio (Funai) serviu de
recente instrumento para uso político da pandemia. Mesmo com, pelo menos, 139
indígenas confirmados com covid-19 e oito mortos (maio de 2019), o texto “Os
Fatos”, publicado no site oficial da Funai argumentou uma
“complacência e participação de ONGs e grupos religiosos” ligados a uma “matriz
marxista” na elaboração de uma política indigenista que se restringiu ao
“assistencialismo subserviente e ao paternalismo explícito”. Ainda, que a
eleição de Bolsonaro representou uma “ruptura” às políticas públicas
“socialistas” que vinham sendo implantadas por governos do PT.
Fome tá
ok?
Com a desastrosa implementação da Medida Provisória (MP) 944/2020 (abril de 2020), a qual
prevê o Programa Emergencial de Suporte a Empregos (Pese), da estimativa de 1,4
milhão de empresas e 12,2 milhões de trabalhadores que teriam acesso à linha de
crédito, apenas 19,3 mil empresas (1,3%) e 304 mil trabalhadores (2,5%)
conseguiram garantir a manutenção do salário através do
programa. Muito além da retórica, Bolsonaro parece apostar na omissão como
estratégia para postergar o auxílio aos trabalhadores e testar a fome da
população, jogando a culpa na burocracia para ver quem volta à postos, mesmo
com a pandemia acumulando mortes.
Cabelo
tá ok?
Enquanto o Brasil se aproximava da marca de 10.000
mortes oficiais por coronavírus (maio de 2020), o presidente ironizava que
faria um churrasco de 3.000 pessoas no Palácio da Alvorada. Bolsonaro justificou que o churrasco era “fake”, mas aproveitou a
data para andar de moto aquática acompanhado de um segurança,
referindo-se novamente ao cenário pandêmico de “neurose”. Dois dias depois
(11), o presidente declarou, durante uma dos seus pronunciamentos na esplanada,
que ele ordenou, por meio de decreto, que academias, salões de beleza,
cabeleireiros e barbearias fossem incluídos como serviços essenciais. O
Ministro da Saúde, Nelson Teich, só ficou sabendo da mudança por meio de
jornalistas durante coletiva de imprensa – visivelmente confuso.
Enquanto isso, a demanda por testes, respiradores e leitos torna-se cada vez mais
crítica.
Fama
mundial, tá ok!
Enquanto ainda há quem diga que a mídia brasileira é
parcial ao denunciar as arbitrariedades do bolsonarismo, entre março e
maio de 2020, centenas de jornais ao redor do mundo noticiaram a
irresponsabilidade de Bolsonaro diante da pandemia. Para a BBC,
“Enquanto o mundo tenta desesperadamente combater a pandemia de coronavírus, o
presidente do Brasil está fazendo o possível para desacreditá-la”, na mesma
linha, The New York Times aponta que “O presidente Jair
Bolsonaro, que chamou o vírus de ‘uma gripezinha’, é o único ‘grande’ líder
mundial que continua questionando os méritos das medidas de bloqueio para
combater a pandemia”.
Soma-se ao alerta internacional os jornais The Guardian, The Economist, Wall Street Journal, Forbes, Business Inder, The Japan Times, The Wire, The Time of India, The Chicago Tribune, The Independent, The
Asahi Shimbun, Al Jazeera, The Sydney Morning Herald, Daily Herald, Jacobin Magazine, TIME e outros – todos ao tom de, “A atitude imprudente
e irresponsável do líder do maior país da América do Sul ameaça causar inúmeras
mortes” (El País) e “Bolsonaro é o líder negacionista mundial do
coronavirus” (Washington Post).
Bolsonaro acumula 30 anos na vida política,
com histórico marcado pelo machismo, racismo, LGBTfobia, discurso de ódio,
desprezo aos indígenas e quilombolas, apologia ao crime, homenagens à Ustra e
Ditadura militar, sugestão da aprovação de uma nova AI-5, desvio de verba e
nacionalismo – apesar de bater
continência para a bandeira dos EUA. Seu discurso se mantém odioso
após a eleição e, pior, autoriza àqueles que pensam como ele a colocarem suas
ideologias genocidas em prática. Nasce, então, o bolsonarismo. Aliás,
nasce, não. Já existia, apesar de disperso. Mas hoje, a ideologia encontra uma
figura que a abarcasse, adotando o sobrenome de Bolsonaro como expressão de um
conjunto de ideais e valores que desprezam a democracia e exercitam o obscurantismo
como instrumento de imposição política.
Apesar de prometer uma “nova política”, o bolsonarismo
tem se mostrado cada vez mais dependente da polarização constante para
retroalimentar sua base mais fiel. Como faz isso? Propagando declarações falsas
ou distorcidas (1023, segundo mapeamento que mencionamos), instituindo o Gabinete
do Ódio e tendo a disposição um exército de robôs para dar volume e engajamento
para sua narrativa. Lembre que empresários bancaram campanha milionária pelo whatsapp anti-PT/Pró-Bolsonaro em
2018. Dentre esses, o Luciano Hang, o “Véio da Havan” (bilionário que
possui dívida de R$168 milhões à Receita Federal) e o MBL, acusado
com frequência por disseminar fake news (agora arrependidos, somando-se aos pedidos de impeachment).
No entanto, a primeira grande queda de popularidade
ocorreu nas últimas semanas, com a insistente postura negacionista em relação à
pandemia da covid-19, além da tentativa de mudar diretoria da Polícia Federal,
indicando um amigo de família, o delegado Alexandre Ramagem e
resultando no pedido de demissão do, agora, ex-Ministro da Justiça Sérgio Moro
que, após um longo período de silêncio, concretiza seu distanciamento do
governo, construindo sua imagem como uma alternativa “moderada” da direita.
Fica claro que a mudança visa salvar seus amigos e filhos da investigação sobre o
rede de Fake News arquitetada pelo Gabinete do Ódio.
Após suspensão da nomeação de Ramagem pelo ministro do STF
Alexandre de Moraes, por entender que houve desvio de finalidade na indicação,
Bolsonaro manobra e nomeia o também delegado Rolando
Alexandre de Souza, considerado braço direito de Alexandre Ramagem. Quem entra
no lugar do Moro no Ministério da Justiça? O advogado e pastor André
Mendonça, outro amigo próximo da família. Esse foi o maior absurdo do governo?
Dificilmente. Foi a gota d’água para muitos? Foi, mas não deveria ser. O que é
uma gota d’água num balde que já estava transbordando desde o início?
Em posse do Estado brasileiro, Bolsonaro ainda
aproximou figuras caricatas para a composição de seus ministérios. Para além de
suas ações, o despreparo técnico e a distorção da realidade tem conduzido
pastas estratégicas para promoção de políticas públicas. Contraditórios, sem
experiência e acusados – diante do absurdo -, quase sempre de estarem criando
cortina de fumaça, seus ministros e articuladores atuam como extensão e reflexo
fiel da narrativa bolsonarista. Alguns destacam-se mais que outros: raramente
de forma positiva.
Fonte:
Jornal GGN