Todos sabemos que
foi por conta do vácuo político provocado pela Operação Lava Jato com decidido
apoio da mídia, juntamente com outros fatores complexos, que um bisonho
deputado de extrema direita foi eleito presidente do Brasil. Seis meses antes
das eleições de 2018 não havia viv’alma neste país que imaginasse esse cenário.
Ele foi chancelado na campanha e no governo pelas elites econômicas e
políticas, (ao se comprometer com um programa ultra neoliberal, garantido
pelo financista Paulo Guedes), incluindo aí a mídia. E pelos militares, cuja
ideologia basicamente é a mesma do ex-capitão. O arranjo tornaria palatável a
incompetência e os rompantes verbais do Jair e sua turma, enquanto Paulo e
seus Chicagoboys governariam o principal, a política econômica. E
assim vinha funcionando, com o apoio irrestrito desses setores e mais de sua
própria base política: militantes de direita, evangélicos e em geral pessoas
que passaram a descrer das instituições democráticas. Apesar da falta de
resultados concretos na economia, ele era protegido pela convicção de que
privatizações, desmantelamento do Estado e supressão de conquistas trabalhistas
e sociais trariam cedo ou tarde a retomada econômica.
Aí apareceu o
coronavírus, o vírus comunista vindo da China, com seus terríveis impactos
sanitários e econômicos. A visão ideológica do presidente levou-o a alinhar-se
entre os que minimizaram o perigo da gripezinha e priorizasse o funcionamento a
todo custo do mercado, custasse o que custasse em vidas humanas. Nesse momento,
assomou seu fanatismo, sua ignorância e seu absoluto despreparo para o cargo.
Ficou claro que a situação estava se retornando insustentável.
As elites se deram
conta de que tinham criado um vírus político e a mídia passou a uma posição
crescentemente crítica ao governo, com destaque para a Rede Globo. Todos
sabiam, quando o apoiaram nas eleições e no governo, quem era o personagem
(radical, preconceituoso, ignorante, medíocre, partidário das milícias,
defensor de ditadura e censura), mas julgaram que o manteriam sob controle.
Esse pessoal teme que se Bolsonaro assumir a condição de ditador se torne uma
espécie de Chavez da direita – governando sem intermediação política (onde os
interesses dos empresários são negociados, legal ou ilegalmente), dirigindo-se
diretamente à sua base ideológica e à parcela mais ignorante e manipulada da
população. Claro que, em caso extremo, as elites políticas, judiciais e
sobretudo econômicas, se adaptam perfeitamente às ditaduras de direita (como
fizeram nos regimes nazista e fascista, nas ditaduras latino-americanas e
asiáticas), assim como os EUA, seu paradigma. Mas o melhor é navegar nas águas
seguras da democracia com a bússola neoliberal. Passaram a questionar
abertamente o presidente, mas ainda não construíram uma alternativa
institucional (pedidos de impeachment, declarações bombástica da oposição
confusa apelando para renúncia e que tais pouco ou muito pouco contam nessa
hora).
Ao sentir que, por
conta de sua posição estabanada sobre a pandemia, perdia crescentemente
sustentação política, Bolsonaro contra-atacou, radicalizando postura e
discurso, na direção de criar impasse que levasse celeremente a uma ruptura
institucional. Enfrentava a mídia com sucesso, usando as redes sociais e a
própria mídia (as repetidas cenas matinais com pequenos grupos de apoiadores,
transmitidas diariamente, funcionam como caixa de ressonância de suas mensagens
mirabolantes; a mídia aceitou o jogo gostosamente, inclusive as próprias
críticas a ela dirigidas pelo capitão, criando dois polos políticos: a direita
fanática de Bolsonaro e a direita civilizada, representada por ela, a mídia, e
os políticos e especialistas escolhidos e convocados a criticar o presidente;
cria-se uma dicotomia artificial, uma falsa polarização com vistas a 2022 –
direita x direita).
É nesse quadro que
o vice, general Hamilton Mourão, saiu do ostracismo e se oferece como a
alternativa de direita segura e racional. Rodrigo Maia corre por fora,
coordenando a atuação do Congresso como um contraponto vigoroso às “loucuras”
da gangue do Palácio do Planalto. E pululam alternativas no campo liberal: João
Dória, Sérgio Moro e até um futuro fantoche como Luciano Huck. Esse
conglomerado tem uma força enorme. Mas sem o apoio do Exército, não ousará
destituir Bolsonaro.
Foi diante desse
quadro de adversidade crescente, que Bolsonaro partiu para a estratégia de
radicalização, contando com seu exército de seguidores nas mídias sociais,
reforçados por batalhões de robô.
O busílis da
questão é a posição dos militares, na superfície uma incógnita total. Mas, a
julgar pela ponta do iceberg, os generais entraram em campo nos últimos dias de
março. Fica para a próxima postagem.
Fonte: Jornal GGN