quinta-feira, 11 de junho de 2020

O REPÓRTER URUBU, POR WILTON CARDOSO




Fareja, ávido, o cheiro da morte.
Baixa sobre o corpo do morto
e faz a necrofesta sensacional
na TV local
ou em rede nacional.

Enquanto devora o morto
e chama os comerciais
derrama lágrimas de jacaré.
Tão sentimentais!

Os entes queridos da vítima
reclamam da gula abutre
em pavonear a morte
e a dor dos que choram.

Então, o repórter urubu
acusa os parentes do morto (ao vivo)
de censurar o trabalho da imprensa,
a liberdade sagrada de expor
sem pudor
o horror da morte
e o desespero da dor.

E qualquer reação física
dos parentes em choque
(avisa o tele-abutre)
pode render um BO,
processos, tribunais…

(Nas entrelinhas: engula
seu desespero e sua dor
e não enfrente o poder
da mídia e a da grana)

O repórter urubu se esbalda
nas necrofestas do asfalto:
bebe sangue, come corpos
e caga ouro.

O repórter urubu
é verdadeiro alquimista
do século XXI.

Fonte: Jornal GGN

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